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Burlandy Paul (1874 - 1922)

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Em fins de 1918, com o fim da Primeira Guerra Mundial, a Bélgica enfrentava grandes dificuldades econômicas, especialmente entre a agricultura familiar. Em busca de novas oportunidades, Jorge Librée idealizou a emigração de famílias belgas para o Brasil. O primeiro passo foi dado por Paulo Burlandy, amigo de infância de Librée, que chegou a São Paulo para adquirir terras destinadas à instalação dos compatriotas. Em 31 de julho de 1919, o jornal O Diário da Manhã registrou a atividade da firma "Renard, Lebricht & Burlandy" no expediente da Secretaria Geral do Estado, sinalizando os primeiros movimentos do projeto.

Por intermédio do padre trapista belga Moreau, Burlandy conseguiu negociar um terreno próximo à cidade de Cananéia (SP), a quatro horas de canoa da cidade, como informou o Correio Paulistano em 1922. A chegada dos primeiros imigrantes foi registrada na Hospedaria de Imigrantes do Estado de São Paulo: em 15 de dezembro de 1919, 91 belgas desembarcaram no porto de Santos, vindos no vapor Provence, dos quais 35 seguiriam para Cananéia. Entre eles, estavam familiares diretos de Burlandy, como sua esposa Josephine, seus filhos, e seu irmão Jean Baptiste. 

O jornal Correio Paulistano de 23 de agosto de 1922 relatou que Alojados na Hospedaria, um grupo se julgava iludido por Burlandy, que os queria encaminhar para lugares insalubres sem conforto. Apenas umas 10 famílias partiram para Cananéia, acrescendo: Uma vez ali, Burlandy foi acusado por todas as privações por que passaram e ainda de as ter defraudado. As famílias e o próprio Librée abandonaram o local.  

Notícia histórica: o mistério na Vila Pompéia, com o assassinato do operário belga

Nos dias 22 e 23 de agosto de 1922, os principais jornais paulistas estamparam, em letras garrafais, um crime misterioso que teria chocado a cidade: um operário belga fora brutalmente assassinado na Vila Pompéia. A cobertura jornalística se desdobrou por páginas inteiras, com detalhes intrigantes e reviravoltas que mantiveram os leitores em suspense por vários dias.

Correio Paulistano
Correio Paulistano – 23.08.1922

O Combate
O Combate: Independência, Verdade, Justiça – 23.08.1922

A vítima era Paul Burlandy, belga de 38 anos e operário-chefe no Curtume Franco-Brasileiro, localizado na Avenida da Água Branca. Seu nome não nos é estranho, pois constava no último boletim do Patrimônio Belga no Brasil, pela sua tentativa de fundar uma colônia belga na cidade de Cananeia, no litoral sul paulista, em 1919.
Na então pacata e recém-formada Vila Pompéia, as notícias sobre um cenário de sangue tomaram forma: Paul Burlandy foi covardemente baleado à porta de sua casa e teve morte instantânea. Assim noticiava o Correio Paulistano“Em Vila Pompéia, bairro que começa a esboçar-se nos confins da Água Branca, próximo da Lapa, desenrola-se uma cena de sangue... A polícia vai desvendar o mistério.”

Burlandy vivia com a esposa, Josephina D’Hollander, os dois filhos do casal — Paulo, de três anos e meio, e Lucy, nascida em fevereiro — além de José Veuaux (também escrito como Venaux ou Venoux), de 14 anos, filho de Josephina com o francês Camillo Veuaux. Segundo as informações, a família residia em um casebre isolado, numa rua escura e mal nivelada.

Segundo o jornal, o crime não teve motivação financeira, pois os Burlandy não possuíam economias. A hipótese mais plausível foi vingança. O passado de Paul em Cananeia voltou à tona: ele fora acusado por seus compatriotas belgas de tê-los defraudado e os abandonado em meio a privações extremas. Nomes como Henrique de Mouenese e Jorge Pierrot surgiram nas reportagens como possíveis inimigos, tendo supostamente ameaçado Paul de morte caso ele se mudasse para São Paulo.

No entanto, no dia seguinte, o próprio jornal revelou que Jorge Pierrot havia ajudado Burlandy a conseguir emprego no mesmo curtume e, inclusive, o convidara a mudar-se com a família para a capital.
Já o jornal O Combate lançou uma nova suspeita: “Mulher de Burlandy estará envolvida no crime? O casal vivia separado, embora sob o mesmo teto.”

A publicação insinuava que a relação conjugal era conturbada. A polícia interrogou o enteado José Venoux e descobriu que Paul seria abusivo com a esposa e o filho dela. Chegava tarde da noite, após longas partidas de jogo, e as brigas eram constantes.
Com base no depoimento da viúva, em 1º de setembro a polícia passou a investigar um novo suspeito: um italiano que teria discutido com Burlandy dias antes do crime por causa de um balão que caiu nas proximidades. Durante a busca, encontraram em sua casa um revólver calibre 32 — o mesmo usado no assassinato — recém-limpo.

E então... o silêncio.
Depois de tanta tinta gasta, as notícias simplesmente cessaram. Nenhuma outra reportagem sobre o caso aparece nos jornais digitalizados da Hemeroteca Digital Brasileira. Como em 1922, também hoje ficamos sem o final da história: teria o culpado sido identificado, houve julgamento ou alguma condenação?
Infelizmente, essas respostas ainda nos escapam e o mistério permanece.